A Vocação sacerdotal

15/02/2012 10:55

 


Por Pe. Sérgio Cavalcante Muniz

 

 

Quando se fala de vocação, normalmente o que vem à mente é a aptidão, o “jeito”, para alguma atividade profissional ou algo assim. Mas pouco valor se dá ao sentido próprio e original da palavra. Com efeito, “vocação” vem do Latim vocare, ou seja, “chamar”. Portanto, falar de vocação supõe alguém que chame e alguém que seja chamado.

 

Todos foram chamados do nada à existência; fomos chamados a serem membros do corpo de Cristo, a Igreja, através do Batismo; somos chamados a viver de acordo com essa identidade e a entrar, enfim, no Reino dos Céus. Mas entre o Batismo e a plena entrada no Reino, somos todos chamados a desempenhar alguma missão. Essa missão será uma maneira específica de viver o Batismo recebido um dia, levando à plenitude suas consequências. Para essa missão também há um chamado divino.

 

Dentre todas as missões para as quais Deus pode chamar uma criatura, nenhuma certamente se comparará em grandeza e sublimidade à missão do sacerdote: continuar, no meio do povo santo de Deus, a presença e a ação do Cristo, único Sacerdote da Nova Aliança (conforme a Epístola aos Hebreus). Os Apóstolos receberam de Cristo o chamado e o poder para serem ramificações vivas d’Ele mesmo, sacerdotes no único Sacerdote. E transmitiram aos bispos, seus sucessores, pela imposição das mãos e consagração, esse mesmo poder provindo de Jesus quando lhes ordenou na última Ceia: “fazei isso em memória de mim”.

 

Tal poder – de ser prolongamento do Bom Pastor no meio do seu rebanho, anunciando a salvação, consagrando a Eucaristia, perdoando os pecados – continua vivo na Igreja, tendo sido transmitido do mesmo modo de geração em geração, sem qualquer interrupção. Mas o seu recebimento não segue, em primeiro lugar, a uma escolha ou decisão do homem, mas de Deus, e, portanto, a uma resposta do homem a Deus que o escolheu. O Evangelho nos apresenta um caso muito interessante para ilustrar a vocação como chamado divino antes que como escolha individual. Trata-se do caso de um homem que, liberto por Jesus de uma grave possessão, manifestou-lhe sua gratidão pedindo para segui-Lo. Jesus não aceitou o pedido; ao invés, deu-lhe uma outra missão: a de voltar para junto dos seus, a fim de testemunhar-lhes as maravilhas que Deus realizara em seu favor (cf. Mc 5, 1-20) Assim, haverá muitos que desejem aceder ao sacerdócio por vontade própria, sem que essa vontade corresponda a um chamado divino. Nesses casos, não se pode falar de “vocação”, porque não há chamado.

 

Mas os Evangelhos narram também o caso doloroso de um jovem que, chamado por Jesus, negou-se a segui-Lo para não ter que deixar os seus muitos bens. O evangelista S. Marcos, em particular, nos dá um belíssimo flash da cena do chamado que o Mestre lhe dirige, convidando-nos a imaginar seu olhar, sua voz: “Fitando-o, Jesus o amou e disse: ‘Uma só coisa te falta: vai, vende o que tens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me’ ” (Mc 10, 21). E como o jovem voltasse atrás sem corresponder ao chamado para o qual ele tinha vindo a esse mundo, o trecho se conclui de modo reticente e sombrio: “Ele, porém, muito triste com essa palavra, saiu pesaroso, pois possuía muitos bens” (Mc 10, 22) O Senhor sempre pedirá alguma renúncia àquele que Ele quer preencher com tão grande dom. Temer responder-lhe positivamente, temer a renúncia é afastar-se da própria realização, da própria felicidade; é condenar-se a permanecer triste para sempre...

 

É imperioso que cada ser humano, e particularmente cada membro da Igreja de Cristo, se interrogue a respeito de sua missão. Essa obrigação paira sobretudo sobre aqueles que ainda não têm definitivamente definido seu estado de vida. Um jovem não deveria excluir a priori a possibilidade de ser chamado por Deus ao sacerdócio; pelo contrário, se houvesse em sua alma algum elemento que fizesse suspeitar de um chamado divino, ele deveria empregar todos os meios à sua disposição (a começar pela oração e aconselhamento vocacional) para chegar à resposta. Não há razão para temer o convite do Senhor, pois Ele o ama mais que você mesmo é capaz de se amar, e só pode querer o melhor para os que Ele ama assim. Aliás, ser escolhido para tal missão é ser escolhido para uma amizade mais íntima e privilegiada com Jesus; é uma altíssima distinção de amor, um sinal de predileção.

 

Permitam, a esta altura, que eu lhes dê um argumento diferente em favor de uma resposta positiva ao chamado do Senhor. Uma resposta que, espero, seja capaz de ajudar aos que eventualmente estiverem a sentir o chamado suave e insistente de Jesus em seus corações. Se quiserem o testemunho de um sacerdote eu lhes dou: como padre, sou feliz. E não vejo nada neste mundo que pudesse fazer-me mais realizado. Melhor que assim, só na eternidade onde espero receber, mais por misericórdia divina que por mérito, a coroa, a recompensa desta felicíssima missão. Agradeço ao Senhor por não me ter permitido errar o caminho; agradeço por me ter ajudado a dizer “sim” à razão pela qual e para a qual Ele me criou e me redimiu. Gostaria do fundo do coração, que muitos pudessem conhecer esta alegria. Esperemos confiantes e rezemos insistentemente pelas vocações sacerdotais – como Jesus mandou!